terça-feira, 30 de julho de 2013

Educar - a perspetiva de Alain de Botton



Alain de Botton é um ensaísta suíço, filho de ateus militantes, que no seu livro Religião para Ateus – Um guia para não crentes sobre a utilização da religião, nos revela o seu olhar sobre as religiões procurando perscrutar nelas o que há de útil, que possa ser aplicado no reino secular. Um dos temas por ele abordado nessa fascinante obra é a educação. E como eu comungo com ele a ideia de que devemos saber aprender com as leituras que fazemos para tentar mitigar alguns males presentes no processo educativo, decidi fazer um resumo, entrecortado com pequenos apontamentos pessoais (a azul) para divulgar a sua tese.

A educação é a forma mais eficaz para promover o desenvolvimento da sociedade, numa perspetiva mais fraterna e humanista. Segundo Matthew Arnold, uma educação cultural deveria inspirar-nos a amar os outros, para que ficassem melhor e mais felizes do que quando os encontrámos, objetivo este que conjuga na perfeição com o que Stuart Mill estabelece para as universidades: criar seres humanos capazes e cultos e não meramente advogados, médicos, engenheiros…
No entanto, torna-se muito difícil descortinar nos conteúdos dos cursos académicos quaisquer competências emocionais ou éticas, restringindo a sua missão ao ensinar-nos a ganhar a vida em detrimento do saber viver.

Com a diminuição da crença religiosa na europa, sobretudo a partir do séc. XIX, a cultura secular ocupou progressivamente o lugar até então atribuído às escrituras, acreditando-se que passaria a cumprir o papel de orientação anteriormente atribuindo à religião. Os romances propiciariam a edificação moral, a pintura aludiria à essência da nossa felicidade, a filosofia abordaria os problemas da ansiedade e da solidão, a literatura mudaria as nossas vidas.

Então, porque é que efetivamente isso não aconteceu? Não terá sido decerto pela falta de material adequado, mas sim pela forma como o tratámos, isto é, por não o termos considerado como fonte de orientação para as nossas vidas. Sendo assim, que razões encontramos para estudar? Recordo um exame oral em que apresentei as minhas dúvidas sobre que relação teria comigo o mito da caverna, pois mais do que um conhecimento acerca de uma história antiga eu queria perscrutar nela uma atualidade, um saber para a minha vida.

Uma cultura relevante e útil, que forneça parâmetros seguros e rigorosos para as escolhas profissionais, os relacionamentos interpessoais, as adversidades não é contemplada pelos departamentos académicos, estando subjacente a independência e maturidade de todos os estudantes.

Ora é exatamente essa a área na qual a máquina pedagógica cristã intervém, pressupondo que cada indivíduo é frágil, vulnerável, pecador, apresentando-lhe os ensinamentos religiosos como estimulantes, tranquilizadores, consoladores e orientadores para a sua alma. 

Enquanto na educação secular se fazem palestras para transmitir informações, na cristã proferem-se sermões para mudar as nossas vidas. E se, no quadro da primeira, raramente colocamos questões verdadeiramente relevantes e diretas aos textos que lemos, por sentirmos embaraço em admitir quais as nossas necessidades interiores, já as parábolas estão na base da abordagem dos textos religiosos pelo seu caráter utilitarista, didático e simples, fatores que, por sua vez, favorecem a resistência secular pela sua proximidade à natureza infantil.

No entanto, são exatamente as estruturas elementares da primeira infância que devem ser reconhecidas como parte importante de nós e tomadas em consideração na forma como o conhecimento nos é transmitido. Isto implica saber que deverá ser dado de forma lenta e cuidadosa, tal como um alimento cortado em partes comestíveis.

Se a clareza e a simplicidade pautassem o ensino secular, contemplando o auxílio e a transformação como motores do desenvolvimento pessoal e interpessoal contemplando os nossos dilemas pessoais e éticos. Entre outros tópicos, poderíamos estudar formas de saber reconsiderar o trabalho, melhorar as relações com as crianças, aproximar-nos da natureza, como enfrentar a doença.

Mas mais do que uma adaptação a nível do conteúdo, a educação secular teria muito a beneficiar com uma reforma dos seus métodos. Raramente, se incide no ponto fundamental, que é, não tanto o de combater a ignorância, mas o de lutar contra a nossa relutância em agir de acordo com as nossas ideias. Para tal, já os sofistas gregos insistiam na necessidade de todas as lições apelarem à razão (logos) e à emoção (pathos). De igual modo, Cícero defendia as capacidades de provar, encantar e persuadir, as quais foram profundamente desconsideradas pela universidade, mais preocupada com as ideias em si.

No entanto, se olharmos para a forma como os sermões são feitos atualmente na igreja católica, verificamos que se despiram de toda a técnica oratória, parecendo servir sobretudo para induzir o sono de velhos e o aborrecimento dos raros novos. O exemplo de S. António, os aforismos, as oposições binárias e a sensibilidade lírica e o à-vontade de John Done, assim como a técnica de pergunta-resposta dos pregadores afro-americanos pentescostais e batistas põem em causa o formalismo que mina as práticas católicas e as académicas.

Para além da forma como são transmitidas, importa notar que as ideias devem ser repetidas. Estratégia esta que é rejeitada pela sociedade secular, que associa a repetição à escassez, defendendo em seu lugar a descoberta espontânea das ideias. Tal convicção condu-la a apresentar-nos um fluxo incessante de novas informações, que poderemos descobrir fascinados, mas esquecemos facilmente.
Metropolis

Vemos filmes, lemos livros tão impressionantes, a partir dos quais pretendemos reconsiderar toda a nossa existência. Mas, basta um dia de reuniões e problemas para essa atitude ficar quase obliterada. “Honramos o poder da cultura mas raramente admitimos a facilidade escandalosa com que esquecemos os seus monumentos individuais” (Botton, p.133).

Uma única leitura linear e/ou eventualmente o sublinhar de algumas frases mais sugestivas não são suficientes para que os livros tenham influência genuína na nossa vida, razão pela qual se torna imprescindível revisitá-los com frequência, para que assim se evite o seu esquecimento.

A este respeito temos o excelente exemplo das crianças que pedem para ouvir as mesmas histórias vezes sem conta, ou visionam incansavelmente os mesmos desenhos animados, pois sentem ser essencial a repetição para captarem e assimilarem toda a informação. E todos nós sabemos como ficamos surpreendidos ao descobrir algo de novo no que já víramos amiúde. Do mesmo modo, os cientistas, os desportistas assim como os artistas sabem que o seu sucesso depende da forma insistente como aprofundam o seu conhecimento e a sua arte. Por isso, lamento tanto que no plano pedagógico, a escola tenha sido invadida pela ideia de que a repetição anula a criatividade como se fosse possível criar sem conhecimento prévio e fundamentado de algo.

Não repetem os seres humanos, há milhares de anos, gestos ancestrais que contêm em si uma cultura que importa conservar? Os judeus, por exemplo, conservam o ritual da leitura em voz alta, uma tradição com origem no cativeiro na Babilónia (537 a. C.). 

Mas fora da esfera religiosa, vivemos absorvidos pelas duas forças motrizes da história moderna: a política e a tecnologia, as quais nos alimentam os desejos de novidade. Sem notarmos, estamos a pagar um preço demasiado alto por essa relação promíscua, ao perdermos diariamente a oportunidade de lembrarmos a nós próprios verdades mais serenas, que deveríamos por em prática.

Não é por nos inundarmos em informação que desenvolvemos a nossa sensibilidade ou inteligência, mas por aprofundar e refrescar a sua compreensão. Neste contexto, as crianças e os jovens são também arrastados como cobaias para experienciar programas e mais programas plenos de pseudo-novidades, com as mais variadas disciplinas, mas onde falta a principal: a do TEMPO, do tempo de reviver as vezes que forem necessárias até se estar preparado para uma nova etapa. O problema do ensino reside no modo de absorção e não na dimensão do conhecimento.
Acresce ainda que poderemos retirar das religiões bons exemplos de exercícios espiritais, que nos façam retirar a educação das salas de aula e combiná-la com outras atividades, encorajando-nos a aprender por meio de todos os sentidos, isto é, fazendo: comendo bebendo, tomando banho, caminhando e cantando.


A cerimónia do chá, no budismo zen, tem em cada aspeto ritual um significado, sendo considerada um dos momentos pedagógicos mais importantes, não para nos ensinar uma nova filosofia, mas sim para tornar a existente ainda mais clara. Do mesmo modo, encontramos nos banhos judaicos (mikvot) um acréscimo de profundidade à ideia de renovação naturalmente atribuída. Estas e outras atividades físicas religiosas estão revestidas de simbolismo e visam apoiar lições espirituais. 

Este treino ritualizado não visa retirar-nos a liberdade, mas reforçar as nossas capacidades emocionais e morais. Treinando a mente e o corpo e treinando aquela através deste as religiões propõem-nos retiros espirituais que nos permitem encontrar equilíbrio interior. Tal não encontra paralelo no mundo secular, onde spas e hotéis rurais nos mostram pessoas com roupões luxuosos e 24h de serviço de quartos, pois visam apenas a satisfação física e a diversão mental, deixando de parte as necessidades espirituais.

Precisamos, pois, de empregar todos os recursos possíveis para operar esta mudança, reconhecendo que somos criaturas cognitivas e sensoriais.

Desconheço se Botton terá alguma vez experienciado aulas de Biodanza, pois pela sua dupla incidência nas áreas emocional e física, creio que reconheceria nesta “dança da vida” as potencialidades para o desenvolvimento do equilíbrio espiritual imprescindível ao ser humano.

Reflexão-resumo feita a partir de: Botton, Alain de (2012). “Educação” in Religião para Ateus – Um guia para não crentes sobre a utilização da religião, Ed. D. Quixote.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

10 formas de amar






Sou uma boa ouvinte, mas quando falo, acuso, sobretudo através de perguntas.
Sou generosa, mas devia saber agradecer muito mais.
Por vezes, calo-me para não brigar, mas queria saber responder tranquilamente com toda a verdade.
Partilho algum saber, alegria, vitalidade e alguns bens materiais, mas raramente dou tanto aos outros (fora do espaço familiar) como a mim.
Reclamo muito o afeto que não recebo, porque sinto muito a sua falta.
Confio loucamente, sem limite até ao momento em que as mentiras e as desculpas apagam a minha entrega.
Tenho dificuldade em perdoar e sobretudo em perdoar-me, mas já foi pior.
Cumpro o que prometo, a não ser que me esqueça!

Conclusão: quero amar mais, ou seja, amar melhor, ou seja, AMAR.

sábado, 13 de julho de 2013

O limite



Querida, Inês:

Vias no teu amado o voo dos pássaros, mas as tuas asas foram progressivamente cortadas com os seus limites decorrentes dos seus medos, das dores, do autismo. Vives com um homem que não tem condição para te fazer sentir amada, por muito que ele te ame. Aceita isso, pois trata-se de uma doença de interação pessoal e não da sua vontade.

Tens os dias preenchidos com esperas de encanto, de surpresas, de sedução, de encontro, mas a tua vida parou nesse tempo adiado.

Querias o milagre de seres a luz que despertaria nele a iniciativa para criar um mundo novo contigo, mas a tua paciência sem fim não chega para resolver tão complexo problema.

Esmeraste-te em diálogos sobre a mudança, diários de desilusões e de deliciosos desejos, listas de questões detalhadas acerca da clarificação do que são e querem ser um para o outro, que nunca apagaram a esmagadora rotina do vosso relacionamento.

Deixaste de chorar, tão apagada que estás. Acabaram-se-te as forças, a raiva, a revolta e ficou apenas um espaço vazio, silencioso, perdido, onde já não cabem promessas.

Puseste tu igualmente limites, na ânsia de provocar o desejo da aproximação, mas foram defraudadas as tuas expetativas, ficando o teu pássaro caído, sem ânimo algum para vislumbrar as portas da gaiola.    

Chegou o momento de estabeleceres o limite a ti própria. Não te envolvas em mais desculpas; tens de escolher como queres viver. Ouve uma música tribal, que te faça descer à terra e sentir o céu, e faz a dança da despedida de ti própria para renasceres do fogo e dares à luz um novo amor na tua praia das laranjeiras

Decide muito bem quem queres amar, pois não fará sentido lamentares-te pelo afeto que não receberes e pelo que não deres; tens força, criatividade, inteligência, e capacidade de entrega suficientes para fazeres maravilhas.

Reza, minha estrela. Aceita que tens de pedir ajuda, ainda que isso para ti não seja do plano do entendimento. Chegou também o momento de sentires a Sua presença.

Para com as acusações, as lamentações, o desespero – são raios de morte, que apagam o brilho da vida. Luta com amor para seres amada. Expressa o teu afeto clara e simplesmente para que o teu olhar voe e encontre o calor da paixão.

Com amor,

Flor

PS: O humor pode transformar os erros em alegria e a água transporta magia.