segunda-feira, 17 de agosto de 2015

O que eu calo





Tenho um cavalo calado no meu peito. Quando danço, o cavalo solta-se e leva-me pelos campos num galope vertiginoso. O movimento da sua crina acaricia-me o rosto e faz-me subir para cima dele, pondo-me em pé no seu dorso, de braços abertos. Assim voamos como dois anjos, unidos, seguros, luminosos, pelas nuvens, que se afastam e nos prestam vassalagem. Quando aterramos, o meu peito ofegante liberta pétalas de rosa, pois o sangue não cabe em mim e torna-se imprescindível impregnar a terra. O meu cavalo passeia-me então, deitada sobre ele, exausta, por este mar vermelho, deixa-me escorregar suavemente até cair na areia, à sombra de uma laranjeira, na praia, e segue para a tropa, que por vezes vejo passar nos meus sonhos mais soltos.

Tenho um jardim calado no meu olhar. Quando brinco na terra, semeando e plantando a vida em potência, eu própria sou girassol, que se alegra maravilhado com a germinação, a força e dádiva de Deus presente na natureza. E sou também cuidadora incansável e entusiasta das mais simples flores. Deixo-me inebriar pelo seu cheiro, deixo a sua cor pintar-me o corpo e vestir-me de felicidade, porque há uma festa em cada uma. No meu jardim, todos os elementos se enamoram, nutrindo-se mutuamente numa simbiose que enlouquece saudavelmente. Sempre que me embrenho na jardinagem, saio mais renascida, mais viva, mais florida.

Tenho palavras secretas caladas no meu sorriso. Quando comemos os nossos beijos, entramos um no outro como touro e tigre, agarrando-nos, ora delicada ora ferozmente, e nos bebemos por inteiro, soltam-se em mim as palavras mais doces, as indizíveis, as que saem do mais íntimo e se impregnam na tua pele e invadem o teu coração de um bem-querer infinito. As minhas palavras enleiam-se nos teus fortes braços, que me dão o colo-ninho mais encantador possível e me envolvem numa paz, que jamais havia sentido. Este encontro, há tanto, tanto desejado, propicia frases de entrega, que só a lógica dos sentidos e das emoções mais puras permite vislumbrar. Por isso, te digo, meu amor: “Contigo, pela primeira vez e mais do que nunca, sinto-me única, encontrada, querida, encantada, linda, respeitada, mulher e mãe amada, feliz, muito, muito feliz.”

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